segunda-feira, 13 de abril de 2009

Guerrilha de Travesseiros

As flash mobs talvez signifiquem mais do que percebemos ao primeiro olhar. No último sábado, o Dia Mundial da Guerra de Travesseiros foi comemorado com a realização de “batalhas” em 26 cidades brasileiras e em mais dezenas de cidades mundo afora. É simples: as pessoas marcam um dia e um horário, se encontram na rua e fazem uma guerra de travesseiros. Apesar dos organizadores negarem, a reunião é uma flash mob: um grande número de pessoas que se reúnem em local público praticam um ação inusitada por um período curto e rapidamente se dispersam. Por mais incrível que possa aparecer, eles deixaram muito mais do que só plumas no ar.

É inerente a essa forma de organização não levantar bandeiras. As manifestações políticas e ideológicas são vetadas o que, evidentemente, parte de uma posição política e ideológica. As primeiras flash mobs traziam certa ironia na crítica aos modismos ao enfatizar seu próprio caráter non-sense. Em pouco tempo, no entanto, se tornaram um modismo e foram usadas para fins publicitários ou políticos. Isso acabou afastando alguns participantes e, simultaneamente, reforçando seu aspecto não institucional. Os eventos não são atos de igrejas, de ONGs, de empresas ou de governos. Um grupo de pessoas decide e faz. Praticar uma nova forma de organização, mobilização e manifestação pode ser o próprio motivo ou objetivo. A principal bandeira é o próprio formato.

Alguns defendem que a forma não é o mais importante. Além da guerra de travesseiros, outras reuniões similares e bem conhecidas são dançar com fones de ouvido, pegar o metro sem as calças ou brincar de rouba-bandeira na praça (silent disco, no-pants day e capture the flag, respectivamente). Uns advogam a favor dos benefícios de reuniões públicas e gratuitas. Há quem as entenda como uma intervenção social destinada a provocar perplexidade. Outros as enxergam como formas de diversão e integração social. Mas é quando enfatizam seus conteúdos que as reuniões sofrem mais resistência.

Suas próprias características fazem que os eventos tenham alcance limitado. Por mais que os principais adeptos sejam jovens de classe média, de grandes centros urbanos, com educação formal, interessados em cultura alternativa, usuários de novas tecnologias e, por tudo isso, grandes consumidores e formadores de opinião, os eventos não têm muito efeito na sociedade. O modismo, a falta de bandeiras assumidas, o caráter não-institucional e a curta-duração se somam e fazem com que seja difícil percebermos sua capacidade de transmitir idéias e provocar mudanças.

No entanto, podemos estar dormindo no ponto se fecharmos os olhos para esse fenômeno. Trata-se de um resultado do momento histórico. As ideologias estão fragmentadas e desgastadas, os movimentos sociais estão pulverizados e enfraquecidos, as instituições perderam sua capacidade representativa. Por outro lado, novas tecnologias melhoraram o acesso à informação, à comunicação e a agilidade na mobilização social, deram ao cidadão comum a capacidade de compartilhar idéias com o mundo todo, de liderar processos, de ser protagonista. As flash mobs são uma forma não violenta de guerrilha: métodos não convencionais, estrutura flexível, alta mobilidade, enfrentamento de estruturas maiores e mais rígidas, discrição na preparação, ataque surpresa, atração do adversário para terreno desfavorável a ele e concentração em alvos vulneráveis. É evidente o potencial do formato para se transformar num fenômeno “do bem”. Se essa prática se desenvolver para algo mais duradouro, poderemos dizer que a transformação se deu também por uma guerrilha de travesseiros.

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