segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Nossos Pecados Frequentes, Públicos e Invisíveis

Que o Brabo me perdoe.
Mas não publicar, ainda que uns trechos, seria um pecado.


Pecar é omitir-se
Por Paulo Brabo

Este é o momento em que o mais desatento dos leitores desta série deverá ser capaz de me acusar de parcialidade, porque terá percebido que estou falando o tempo todo em espírito subversivo, em comunidade inclusiva e mudar o mundo, e não reservei qualquer espaço ou qualquer ênfase para falar de pecado ou de condenação (que é sua consorte) ou de salvação (que é o seu algoz). Quem me acompanhou até aqui poderá ter a impressão de que a boa nova que encontro nos evangelhos e neste livro de Atos apregoa menos uma religião a ser adotada (ou uma salvação a ser apropriada) do que um movimento revolucionário, com conotações vagamente hippies, cuja imoderada ambição é derrubar preconceitos, desarmar impérios e corrigir desigualdades ancestrais tendo um sonho por capacete e uma flor por espada. Meu leitor poderá pensar que vejo o cristianismo deste primeiro século como uma conspiração radical e pacífica, soprada do céu mas com consequências muito práticas e exigentes neste nosso mundo; um movimento humanitário e humanizador cuja marca mais visível e consistente era a promoção de toda sorte de inusitada reforma social, tendo em vista a criação de uma nova e radicalmente inclusiva estirpe de comunidade, pelo uso indiscriminado e intransigente da (sempre perigosa) ferramenta da paz e do amor. Poderá concluir que é mais ou menos isso que, na minha visão, Jesus entendia por reino de Deus.

(...) Não estarei então, com essa história de paz e amor e de reforma social, sendo culpado de dourar a pílula e de minimizar as ênfases dos apóstolos na necessidade de uma nova vida de pureza não apenas social mas pessoal (ou, para chutar o pau da barraca, já que é nisso que estamos sempre pensando, pureza sexual)?

(...) Para Jesus, nossas faltas mais graves são justamente os nossos pecados mais frequentes e mais públicos – e também os mais invisíveis, aqueles que precisamos de uma epifania, uma poderosa e inclemente intervenção exterior, para sermos capazes de enxergar. Porque para ele os pecados realmente graves não são os que promovem as distrações da carne ou as atrofias da irreligião, mas os que dizem respeito às relações entre as pessoas. Pecar não é rebaixar-se ao sensorial ou negar-se a dobrar-se à devida evidência; pecar é recusar-se a ser como Deus, e recusar-se a ser como ele é recusar-se a oferecer indiscriminadamente a misericórdia. Pecar é sonegar um abraço, um curativo e um lugar à mesa.

(...) Escandalosamente, na cena final os condenados não são os que fizeram o que não era permitido, mas os que deixaram de fazer o bem ao próximo – “porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; era forasteiro, e não me acolhestes; estava nu, e não me vestistes; enfermo, e na prisão, e não me visitastes”.

A última mensagem de Jesus na narrativa de Mateus é, portanto, a mesma tão calorosamente avançada por Lucas ao longo do seu próprio evangelho e da sua continuação. Para nós a reviravolta reside em que, ao contrário de tudo que a tradição cristã levou-nos a pensar nos séculos que nos separam dos dias do Filho do Homem, pecar não é fazer o proibido: pecar é omitir-se.

Leia o texto completo aqui.

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